A direção espiritual

Também a vida interior precisa de «técnico»
 Se você tem direção espiritual, já sabe da importância dessa orientação para manter vibrante a vida interior e, em geral, para progredir na vida cristã. Tanto se a tem como se não a tem, talvez o ajude pensar nas considerações que faço a seguir.
            É interessante lembrar que a Igreja sempre tem recomendado a direção espiritual a todos os que desejam amadurecer seriamente na vida cristã; de forma análoga a como se aconselha a um cardíaco procurar a orientação de um cardiologista, e a um jogador de futebol ou de tênis a ter um coach, um técnico que os prepare e oriente. Ninguém é bom técnico de si mesmo.
            São Josemaria fala disso com uma imagem simples: «Convém que conheças esta doutrina segura: o espírito próprio é mau conselheiro, mau piloto, para dirigir a alma nas borrascas e tempestades, por entre os escolhos da vida interior. – Por isso, é vontade de Deus que a direção da nau esteja entregue a um Mestre, para que, com a sua luz e conhecimento, nos conduza a porto seguro» (Caminho, n. 59).
O bom pastor
            O confessor e, em geral, a pessoa que atende a direção espiritual de outros, participa da missão do bom pastor. Como diz Jesus na parábola, o bom pastor conhece as suas ovelhas e elas o conhecem, vai indicando-lhes o caminho e as conduz a bons pastos, também as defende dos ladrões e do lobo (cf. Jo 10, 4-14), e procura as que se extraviaram e as ajuda a voltar (cf Lc 15,4-7).
            O bom diretor espiritual deve ser um reflexo desse Bom Pastor, que é Jesus. Por isso, é importante pedir luzes ao Espírito Santo para escolher bem o diretor:   sempre com plena liberdade, mas com o desejo sincero de avançar espiritualmente. Não adianta escolher um diretor espiritual que seja apenas um padre «amigão» para bater papo. E, menos ainda, procurar um confessor ou diretor que se limite a «compreender-nos» (ou seja, desculpar-nos!) sempre e não nos fale com clareza e afeto, nem nos ajude a lutar e a retificar os erros.
            Para ter uma direção espiritual eficaz é importante que, depois de ter escolhido conscientemente um diretor, sejamos perseverantes e combinemos com ele conversas periódicas, por exemplo, mensais (não mais espaçadas). Não é direção espiritual ter um padre de confiança e conversar com ele só duas ou três vezes por ano.
            Dizia que a escolha do orientador espiritual deve ser livre. Também deve ser livre a nossa decisão de praticar os conselhos que nos sugerir. Mas a liberdade exige pensar e decidir responsavelmente. Peça, por isso, ao Espírito Santo – om verdadeiro Diretor das nossas almas -, que lhe conceda o dom de entendimento, para compreender o que Ele lhe quer dizer através do diretor espiritual, e o dom de fortaleza, para esforçar-se em levá-lo à prática.
            Creio que, após mais de cinquenta anos de experiência de direção espiritual, posso afirmar que só vi progredirem espiritualmente – e assim caminharem para a santidade, meta da vida cristã – os que vivem com perseverança um plano de vida espiritual e levam a sério, com constância, a direção espiritual.
Sugestões práticas
            Para viver com proveito a direção espiritual, além das sugestões que acabamos de ver, aconselho vivamente o seguinte:
            1) Prepare bem cada conversa, fazendo um pouco de meditação a respeito e tomando umas notas por escrito: uma listinha dos temas de que quer falar; e, sobretudo, como lhe estou insistindo, pedindo muito a ajuda do Espírito Santo;
            2) Não vá à direção para gastar o tempo com conversa mole, falando das notícias do jornal, do frio e do calor e de outras coisas que nada tem a ver. Em todo caso, só uns dois minutos, como «prólogo» para começo de conversa.
            3) Não se esqueça de começar informando como é que viveu os conselhos e sugestões recebidos na última conversa, as dificuldades com que deparou para cumpri-los, as fraquezas (preguiça, tentações,etc.) que o levaram a abandoná-los, etc.
            4) Comente também as inspirações, os bons pensamentos que Deus suscita em nós para melhorar alguns defeitos, concretizar algumas iniciativas de vida espiritual ou de apostolado, fazer novas mortificações, etc. É muito bom não ser «sujeito passivo», que só escuta conselhos. Seja também «ativo», pense e apresente novas propostas de luta espiritual (por exemplo: gostaria de ler tal livro; pensei tais e tais penitências e temas de meditação para a Quaresma; gostaria de preparar o Natal assim; pensei que poderia ter tal conversa com um amigo afastado de Deus).
            5) Os «temas» da direção espiritual, os assuntos que convém tocar nas conversas com o diretor, são muito variados, e é impossível falar de todos em uma só entrevista (tendo também em conta que, muitas vezes, só poderá contar com meia hora ou pouco mais). Mas, como fizemos em outras reflexões, vou sugerir-lhe aqui alguns que julgo mais importantes:
            a) em primeiro lugar, fale claro dos assuntos que – por vergonha, por medo de ficar mal e de desiludir o diretor – mais lhe custe falar: uma queda mais séria, uma infidelidade, uma reincidência na preguiça e nas omissões, etc. São Josemaria dizia que «quem oculta ao seu diretor uma tentação, tem um segredo a meias com o demônio» (Sulco, n. 323). E, em sentido positivo, acrescentava: «Acabaram-se as aflições… Descobriste que a sinceridade com o diretor conserta com uma facilidade admirável aquilo que se entortou (ibid., n. 335).
            b) depois, os problemas que estão exigindo mais esforço, mais oração e, às, vezes, mais conforto e até consolo: dramas familiares, filhos que se desencaminham, graves dificuldades no trabalho, doenças sérias. Tenha, porém, em conta que, se você só buscasse consolo, não acharia solução. O melhor consolo é o «conforto», ou seja, o conselho que fortalece e ajuda a levar com garbo aquela cruz e a santificar-se com ela. Por isso, perante uma grave problema, às vezes o melhor conselho é o de viver com mais intensidade o plano de vida espiritual.
            c) sempre comente como foi o seu plano de vida espiritual: se o cumpriu, se foi constante e pontual, como fez a oração e o exame diário, como preparou as Comunhões, que empenho colocou em melhorar a presença de Deus no trabalho, como praticou as mortificações habituais, que frutos  ou dúvidas lhe suscitou a leitura do Evangelho e de algum livro espiritual, etc.
            d) é preciso tratar das virtudes, especialmente daquela ou daquelas que mais falta nos fazem: humildade, paciência, castidade, ordem, intensidade e perfeição no trabalho, caridade, luta contra os defeitos do temperamento, etc.
            e) tendo em conta que não há verdadeiro amor a Deus sem amor ao próximo (cf 1 Jo 4,20-21), convém falar da nossa melhora no trato habitual com os que convivem e trabalham conosco (especialmente esposa, marido, filhos), e do apostolado que fazemos (primeiro, do apostolado pessoal com parentes, colegas, amigos; depois, da colaboração em iniciativas de apostolado).
            f) se estiver se sentindo incomodado com alguma dúvida de fé, alguma dificuldade para entender a doutrina da Igreja, algumas palavras do Papa que não entendeu, etc., não deixe de apresentar essa dúvida ao diretor.

            São apenas algumas sugestões. Acho importante repetir que não se trata, em absoluto, de falar de «tudo» em cada conversa. Fale do que seja mais relevante e mexa mais com a sua alma, especialmente do andamento do plano espiritual. Em todo caso, parece-me que essas sugestões não deixam de ser um roteiro útil para preparar as conversas de direção espiritual e para avaliar se essa orientação vai bem.
http://www.padrefaus.org/archives/895

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